Rui d’Espiney (ICE)
1. As preocupações do movimento associativo com as condições necessárias ao seu funcionamento e existência não são de agora. Ao longo dos anos, muitos, e de variado âmbito, foram os Encontros, os Fóruns, os Debates que se realizaram tendo em vista caracterizar as potencialidades e constrangimentos que a ele se levantam, havendo-se inclusivamente identificado e fundamentado um sem número de reivindicações e aspirações passíveis de contribuir para o seu desenvolvimento e sustentabilidade.
Recuperando e potenciando toda a reflexão até hoje realizada, o movimento que se iniciou tendo em vista a organização de um Congresso do Associativismo e da Democracia Participativa não se limita, no entanto, a ser um mero acto de continuidade.
Três ordens de factores ditam, com efeito, a especificidade que o define e caracteriza. A saber:
- O momento em que surge;
- Os propósitos que prossegue,
- O modo como se desenvolve e organiza.
2. Quanto ao momento, pode dizer-se que os tempos são únicos, marcados que estão por uma crise multifacetada:
Crise, sem igual, das associações com muitas delas lutando pela sobrevivência, obrigadas a recorrer ao crédito ou a despedir técnicos, pese embora a riqueza e a importância económica, cultural social e politica das dinâmicas e actividades que animam.
Crise económica (financeira), sem precedentes, que se procura resolver por recurso às lógicas e práticas que produziram essa mesma crise e sem nunca se considerarem as soluções de alternativa e ruptura presentes nas iniciativas de economia solidária a que se acham ligadas muitas associações.
Crise social (desemprego, pobreza, desigualdades) cada vez mais acentuada e face ao qual o Estado se revela impotente e madrastro tendendo a retirar meios a quem a combate.
Crise da democracia representativa, por um lado marcada pelo alheamento dos cidadãos e por práticas pouco participativas, e por outro ameaçada nos seus próprios fundamentos – como o mostram as vozes que já se ouvem a favor da transferência de competências do legislativo para o executivo ou a possibilidade, emergente, de se submeter os orçamentos portugueses a vistos prévios da Europa.
Crise da Democracia Participativa, com os cidadãos afastados dos Centros de decisão, transformados em utentes, invadidos na sua intimidade, impedidos, pelo medo, de impor os seus direitos e de fazer jus à sua dignidade nos serviços e empresas de que dependem ou a que recorrem.
3. Quanto aos propósitos, distingue-se todo este processo por pelo menos 6 grandes ordens de razões:
• Em primeiro lugar, e desde logo, pelo facto de se querer que ele assuma a forma de um movimento social que, em última analise, pugne por uma redistribuição dos poderes no quadro por uma democracia efectivamente plena. O Congresso surge, não como um fim em si mesmo mas como um momento passível de impulsionar este movimento.
• Em segundo lugar, pelo facto subsequente de se assumir como um projecto político onde está em causa, não apenas a viabilização da democracia participativa mas também, ou inerentemente, a requalificação da Democracia Representativa, chamada a abrir-se à participação dos cidadãos nos domínios de decisão que lhe vem cabendo.
• Em terceiro lugar, pelo facto de procurar implicar associações trabalhando nos mais diferentes domínios – Saúde, Educação desenvolvimento Ambiente - e orientados para públicos diversificados – idosos, imigrantes, mulheres, etc.
• Em quarto lugar, pelo facto de, indo buscar a sua força ao associativismo, considerar que a Democracia Participativa se não esgota nesta, que há outras formas organizadas de Democracia Participativa que não apenas as Associações e que há diversos “espaços” na sociedade onde o défice de Democracia deve ser combatido (escolas, empresas, Instituições, etc).
• Em quinto lugar, pelo facto de, apoiando-se no Associativismo, eleger como objecto de reflexão as próprias associações reconhecendo que também muitas delas tendem a assumir-se como espaços de continuidade e não de rotura com os poderes instituídos, que também muitas delas não promovem e acima de tudo não produzem participação, que também muitas delas carecem de questionar(se) quanto ao que se entende e deve ser o associativismo cidadão.
• Em sexto lugar, e finalmente, - em grande medida transversalmente aos propósitos anteriores – pelo facto de se pretender induzir o desenvolvimento de um pensamento crítico que contribua para uma pratica e uma abordagem alternativa no domínio ao desenvolvimento e da construção do futuro.
4. Quanto ao modo como se desenvolve e funciona este processo, distinguem-no pelo menos quatro aspectos.
► Em primeiro lugar, a circunstância de assumir como dimensão “estruturante” a informalidade, bem patente no funcionamento da promotora, espaço aberto, de geometria variável (integrando quem aparece); ou na opção de dar aos espaços de debate no Congresso a forma tertúlias, voltadas para a troca, a partilha e a simetria na participação;
► Em segundo lugar, a circunstância de se estar a organizar de “baixo para cima”, apostando-se na multiplicação de reuniões a nível local e regional orientadas, não apenas para a mobilização mas para a reflexão, para a formulação de propostas (de temas de debate)
► Em terceiro lugar, a circunstância de se procurar induzir, no próprio processo da mobilização para o Congresso, a construção ou promoção de redes de associações tendo em vista contribuir para combater o seu isolacionismo.
► Em quarto lugar, e finalmente, a circunstância de se “fechar” o Congresso com uma Assembleia Deliberativa de que possam sair dois tipos de documentos:
Um texto de orientação estratégica tendo em vista o combate pela construção da Democracia Plena, a partir da afirmação da Democracia Participativa, hoje em deficit e a explicitação de um caminho alternativo para a superação da chamada crise.
Um caderno reivindicativo que responda às preocupações das associações, confrontados que estão, hoje, com a sua própria sobrevivência.
,,,privilegiar o debate, com conclusões, sobre as diversas Formas de realizar Democracia Participativa, alargada e eficaz....
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