domingo, 15 de maio de 2011

APONTAMENTOS REFERENTES À REUNIÃO DO MOVIMENTO DA DEMOCRACIA PARTICIPATIVA, REALIZADA EM COIMBRA EM 02/4/2011

PRESENÇAS: Ana Paula Dias, António C. Ferreira, António P. Pereira, Cheikh B. Abdellahi, Fernando Ilídio, Francisco Silva Alves, José João Rodrigues, Lurdes Cravo, Maria José Tovar, Paula Medeiros, Rui d’Espiney e Vítor Andrade.

Nota: o Francisco Silva Alves participou pela primeira vez nestas reuniões, motivado pelo documento produzido pela Plataforma do Movimento.

Ordem de Trabalhos aprovada:
Ponto1- Registos referentes às reuniões
Ponto2- “mailing list”
Ponto3- Tomadas de posição/intervenções
Ponto4- Núcleos de dinamização
Ponto5- Acções

Ponto1 – Concordou-se em que, no início de cada reunião, ficará uma pessoa encarregada de coligir e divulgar posteriormente os registos mais relevantes dessa reunião, devendo esta função ser atribuída rotativamente entre as pessoas disponíveis para o efeito. O António Ferreira aceitou o cargo em relação a esta reunião.

Pontos 2 a 4 – Todos os presentes na reunião participaram com intervenções, algumas das quais contemplaram vários dos pontos, sem grande “obediência” à ordem de trabalhos estabelecida. Como alguém referiu, “discutiu-se sobretudo a partir do que nos mobiliza, desocultando as nossas próprias inquietações”.

Assim, apresentam-se os registos organizados em torno dos principais tópicos abordados, referentes a conteúdos desafiadores para debate dentro e fora do movimento.

Tópico 1 - A crise da democracia
A subvalorização da democracia participativa (D. P.) acontece à custa da hipervalorização duma democracia representativa (D.R.) que não se questiona sequer em relação aos 52% da população que não votam nunca; além disso, no Parlamento, os discursos dos deputados são aplaudidos apenas pelo seu próprio partido, com manifesta surdez de cada grupo em relação aos discursos provenientes de outros partidos, por mais semelhante que seja a mensagem.
E contudo a D.P. devia ser valorizada como alternativa de governação mais abrangente e económica, dadas as potencialidades das tecnologias de comunicação que podem sustentá-la.

Tópico 2 – Superar isolamentos para criar movimento
-- Porque é que os países periféricos da EU vivem problemas graves e semelhantes mas não se organizam numa frente comum face ao que a França e a Alemanha decidem? Porque é que ninguém fala da Islândia?...e no entanto está a procurar dar a volta à crise sem se submeter às imposições do modelo neoliberal…
-- Em Portugal, as iniciativas de DP vão sendo olhadas caso a caso. Porque não se criam redes de relações entre estas iniciativas, dando forma a um movimento conjunto, alternativo/alterativo?
-- Porque não se vê cooperação entre as câmaras dos concelhos do interior do país, isolados e com grande carência de recursos?

Tópico 3 – Crescimento da economia e desenvolvimento social
-- Nos PECs, o C de crescimento corresponde a uma perspectiva que procura a saída da crise através do crescimento da economia sem se preocupar com quem se apropria da riqueza produzida.
--“ Quem manda agora não são os agentes políticos mas os agentes económicos, os quais, aliás, não são responsabilizados…”
-- “Muita gente de áreas de esquerda não se sente à vontade em economia… e limita-se apenas a reagir contra as teses neoliberais que a direita vai produzindo, mas sem apresentar alternativas…
-- É importante perceber e analisar criticamente os “mercados”, superando o fatalismo e a submissão perante as regras que querem impor-nos.
-- Vai emergindo cada vez mais a necessidade de compreender as dinâmicas dos sistemas económicos e de procurar caminhos que sustentem um desenvolvimento das sociedades com mais equidade, democracia, solidariedade e respeito pelas diferenças culturais e pelo ambiente.
Em relação com este tópico foram partilhadas algumas informações: -- há entidades que têm vindo a realizar encontros de estudos e debate, como por exemplo, a Fundação Betânia (encontro sobre economia e civilização, Março de 2011) e a Nova Almedina, em Coimbra (encontros sobre economia à sexta feira). O grupo Economia e Sociedade, integrado na Comissão Nacional Justiça e Paz, está a preparar a realização de encontros em vários locais. Um grupo de activistas, reunido em Pequim, em 2008, aprovou a Declaração de Pequim, em que se procuram caminhos no sentido de a actual crise se tornar uma oportunidade. Foram ainda feitas referências a manifestações, em Portugal (não pagamos a dívida, não pagamos a crise) e na Europa (prevê-se a manifestação europeia em Londres em Outubro de 2011). Autores e documentação sugeridos: Boaventura Sousa Santos (Centro de Estudos Sociais – Univ. Coimbra); documentação da Fundação Betânia (www.fundacao-betania.org) e da Comissão Nacional Justiça e Paz. Jacques Généreux (“As verdadeiras leis da economia”). Vítor Bento…

Tópico 4 – A acreditação das associações
Há sinais claros de avanço do processo com vista a legislar-se sobre a acreditação das associações. A Animar vai intervir neste processo mas abdicou de fazer um debate prévio a nível interno. Ora, debater a acreditação das associações sem debater a cidadania é não chegar às questões de fundo.
Por tudo isto, foi considerado prioritário contribuir para um debate aprofundado sobre a acreditação das associações.

Tópico 5 – A indiferença das instituições estatais face às características e necessidades das pessoas e comunidades
-- Até que ponto as decisões que em breve serão tomadas sobre a redução do número de municípios, freguesias, e serviços estatais a nível local, irão ter em conta as necessidades e a cultura das respectivas populações?
-- Até que ponto as reduções havidas desde há alguns anos em número de escolas e serviços de saúde a funcionar em meios rurais do interior têm em conta as necessidades e a cultura dessas populações?
-- Até que ponto os órgãos do estado, começando pela própria segurança social, conseguem ver para além dos entraves burocráticos e atender às necessidades das pessoas em situação mais vulnerável?

Tópico 6 – As microempresas
Faz falta uma atenção específica às microempresas, que representam uma realidade diferente das PMEs. A falência de uma microempresa não significa apenas a sua dissolução, tendo um impacto enorme na (s) pessoa (s) e família (s) envolvidas nessa microempresa. Daí que as microempresas necessitem de micromedidas, a nível local, promovendo nomeadamente a ligação de sustentabilidade entre as microempresas e o processo de desenvolvimento local.

Tópico 7 – Liberdade, Solidariedade e Cidadania
-- Em torno do 25 de Abril, poderíamos tentar debater, por exemplo, a ideia de “25 de Abril – dia da Liberdade”/”25 de Abril – dia das Liberdades”.
-- A nossa sociedade tem vindo a tornar-se cada vez mais predadora, nomeadamente nos domínios financeiros e especulativos.
-- Muitos espaços de trabalho são espaços de opressão. A liberdade não é algo natural e adquirido mas algo que se constrói todos os dias.
-- A primeira geração de Médicos de Família está a aproximar-se ou a atingir a idade em que já é possível reformar-se, e muita gente está a fazê-lo atendendo apenas aos seus próprios interesses, muitas vezes mantendo outras alternativas de actividade profissional, sem ter em conta que presentemente e durante os próximos cinco anos há grande falta de médicos de família no Serviço Nacional de Saúde.
-- Em Espanha, grupos de estudantes de medicina têm vindo a promover debates sobre direitos humanos, direitos face à saúde, etc.
-- A Solidariedade é um conceito fundamental, mas é preciso contrariar a tendência para colar esta palavra a uma conduta assistencialista; em vez disso, a solidariedade liga-se à cidadania e aos direitos humanos. Numa perspectiva planetária estes conceitos contribuem também para se opor a altermundialização à globalização hegemónica.
-- Olhando a crise como um desafio para a procura de oportunidades de transformação, abrimo-nos ao aprofundamento de temas como o poder da cidadania, a liberdade, a justiça social e a igualdade de género face ao trabalho. Desta forma entendemos também o impacto destes valores nas políticas que queremos.
-- A comunicação/debate/conscientização em torno destes temas tem de começar pelo mais básico e em várias frentes. Assim, se é importante tudo o que se passa através das redes sociais da internet, são igualmente importantes as iniciativas envolvendo comunidades locais, vinculadas por laços culturais, afectos e projectos.
-- A recente experiência da Kriscer, promovendo sessões ao nível comunitário, é uma referência quanto ao envolvimento progressivo das pessoas e famílias à medida que tomam consciência da dimenção dos problemas que lhes dizem respeito e da necessidade de encontrarem respostas solidárias face a esses problemas.

Tópico 8 – Jovens
-- Os jovens não estão muito motivados para discussões em torno de temas como a DP versus DR, o que não quer dizer que estejam desinteressados de processos participativos.
-- Poderão mobilizar-se, por exemplo, a partir de factores emocionais, nomeadamente quando algo toca fundo as suas vidas e o seu futuro, como o recente acontecimento da manifestação da “geração à rasca”. Aliás, em relação a esta manifestação, é de valorizar o papel fundamental da internet como instrumento de comunicação e divulgação.
-- Em Bruxelas, está a haver um movimento juvenil intitulado “movimento das batatas fritas”, que congrega os jovens através de eventos com batatas fritas grátis, nos quais manifestam o seu descontentamento perante a instabilidade política e a sua incerteza face ao futuro (as “batatas fritas” são um instrumento para dizerem: - “não nos lixem o futuro!”).

Tópico 9 – Nós e “o que fazer?”
-- Talvez devamos começar pela questão sobre o que faz falta fazer com as pessoas que têm participado no movimento e também com a população em geral. O ponto de partida pode ser o sentimento de inquietação que abrange hoje toda a nossa sociedade. São as inquietações e a nossa capacidade para explicitá-las e devolvê-las que podem ser mobilizadoras. O que estamos à procura não é só de uma alternativa mas de uma alterativa (algo de novo que altere o mundo).
-- O nosso caminho é o das lógicas de intervenção, quer promovendo iniciativas próprias quer estando atentos para interagir com o que acontece, procurando participar, apoiar e divulgar iniciativas de outros, integrar contributos, organizar em rede, etc. Estas lógicas de intervenção representam dois dinamismos complementares em que a ideia de conscientização é fundamental. Nesta perspectiva, é igualmente importante a complementaridade entre a lógica da denúncia e a lógica do anúncio (não se trata de responder à denúncia com um “anúncio dos iluminados”, mas de construir em diálogo e debate essa resposta ao que denunciamos na realidade em que vivemos).
-- Quanto às formas de concretizar a nossa intervenção, podem passar pelo debate de tópicos através da mailing list com responsáveis pela gestão desses debates, ou de sessões/tertúlias/outras iniciativas dentro do nosso movimento, entre diferentes movimentos e associações, ou ainda a nível comunitário.
-- É finalmente oportuno que o movimento avance para um manifesto em que explicitemos o que queremos.

Ponto 5 – ACÇÕES
Em relação à animação de debates sobre temas prioritários através da mailing list ou de outras vias, vários dos presentes assumiram o compromisso de se empenharem nos seguintes temas:
-- Acreditação das associações – Fernando Ilídio, Lurdes Cravo, António P. Pereira (a confirmar)
-- Economia/crescimento vs desenvolvimento -- Francisco Silva Alves
-- Microempresas – José João Rodrigues
--Solidariedade/cidadania – António C. Ferreira (em ligação com GAF e Base FUT)
-- Reflexão crítica sobre a democracia representativa – Rui d’Espiney
-- Associativismo cidadão – Rui d’Espiney

05/2011
António Cardoso Ferreira